quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

COMO FUNCIONA A ORIENTAÇÃO VOCACIONAL?

Muitas pessoas me perguntam como funciona a orientação vocacional, se essa técnica dá resultados, quando e como deve ser usada. Alguns nem sabem que ela existe ou que isso é possível. Existem ainda os que fizeram orientação vocacional várias vezes sem resultado satisfatório. Vamos falar um pouco do tema e tentar responder a essas perguntas de forma objetiva e clara. 

A orientação vocacional é uma técnica utilizada para identificar as competências de uma pessoas e a correlação dessas competências com as funções existentes no mercado de trabalho, ou seja, verificar quais são as aptidões e interesses de uma pessoa e em que emprego isso se encaixa. A orientação vocacional começou a ser de fato, estudada por psicólogos, na Segunda Guerra Mundial, quando o EUA estavam selecionando soldados para as forças armadas. Daí veio a Revolução Industrial abrindo um leque de novas possibilidades de trabalho, e o mundo passava ao mesmo tempo por mudanças na estrutura da sociedade. 

Mas não pense que a orientação vocacional é uma teoria isolada, ela se baseia em teorias psicológicas que procuram explicar e compreender o comportamento humano. Uma das teorias na qual a orientação vocacional se apoia coloca que:

"... a decisão vocacional é um processo que ocorre durante um período extenso da vida e não num momento determinado; à medida que o indivíduo cresce, os fatores da realidade tornam-se cada vez mais importantes como determinantes da escolha vocacional (...) está relacionada com sua inteligência, nível socioeconômico dos pais, necessidades de status, valores, interesses, habilidades nas relações interpessoais..."(LEVENFUS, BANDEIRA, 2009) 


Muitos fatores interferem na sua escolha vocacional de uma pessoa, como o dito acima, não só os interesses particulares do indivíduo, mas também o meio externo, as condições sociais e econômicas, a influência familiar, a cultura e o ambiente. Além disso, as constantes situações que o sujeito vive acabam por modificar sua percepção da realidade e seus próprios interesses. Se aquela pessoa irá encontrar satisfação no seu trabalho quando esse trabalho permitir que a pessoa seja quem é, ou seja, que realize seus valores, que utilize seus talentos, que permita com que se sinta útil e possibilite que realize seus desejos. O que as teorias psicológicas tentam englobar são as aptidões, interesses, características da personalidade e autoconceito que formam o comportamento. A partir do entendimento dessas categorias é possível desenvolver um sistema matemático e descritivo onde é possível encaixar cada pessoa, mesmo com suas individualidades e particularidades, em cargos e ocupações. 


COMO É O PROCESSO DA ORIENTAÇÃO VOCACIONAL

Primeiramente o psicólogo irá fazer uma entrevista de anamnese, ou seja, irá questionar o avaliando sobre vários aspectos da sua vida, fará perguntas para compreender um pouco da sua história de vida, da dinâmica familiar, explorando tudo que possa ser pertinente para ajudar na escolha da profissão. Depois o psicólogo aplicará alguns testes. Chamamos de bateria de testes porque englobam testes com diferentes finalidades que irão desenhar o perfil daquela pessoa. A partir da análise desses testes aspectos da personalidade, do comportamento, das emoções, dos interesses do indivíduo ficarão claros para o psicólogo, que irá analisar esses dados e apresentá-los para o avaliando. Com base nesses resultados e da utilização de manuais específicos, as possibilidades de profissões ficarão mais claras. 


EU JÁ FIZ VÁRIAS ORIENTAÇÕES VOCACIONAIS E AINDA NÃO SEI QUE PROFISSÃO SEGUIR!

Isso aconteceu com você? Procurou um psicólogo habilitado? Ele fez o processo que descrevi acima com você? Somente conversar sobre seus interesses vocacionais não é suficiente, embora possa funcionar em alguns casos. Imagine um médico. Ele pode saber o que você tem pelos sintomas, mas para ter certeza ele pode pedir um exame de sangue. O exame de sangue vai dizer o que está dentro de você, que nem você nem o médico sabiam (embora o médico possa ter uma vaga ideia). O teste psicológico funciona da mesma forma, ele vai mostrar ao psicólogo aspectos da sua personalidade, interesses, etc que nem sempre são possíveis saber a partir de conversa e observação. Algumas pessoas são muito indecisas, de fato, e é preciso um bom psicólogo para guiá-las pelo universo das profissões.

Algumas escolas realizam orientação vocacional com seus alunos, sendo esse procedimento feito por psicólogos (de preferência), contudo, dependendo do aluno pode não ser suficiente. É muita pressão você decidir seu futuro profissional enquanto tem que estudar para passar num vestibular. Algumas pessoas já sabem o que querem, outras não e são essas que precisam da orientação vocacional.


FIZ UM TESTE VOCACIONAL NA INTERNET E NÃO AJUDOU MUITO...

Vou ser bem claro, testes vocacionais de internet, de revistas, NÃO são instrumentos científicos, então não tem eficácia comprovada. São elaborados por pessoas que tiram ideias que acham interessantes e criam um sisteminha de pontos. Os testes psicológicos usados na orientação vocacional são baseados em teorias validadas cientificamente, são estudados com bases matemáticas e estatísticas e comparados com outro instrumentos similares para comprovar sua validade. Alguns desses testes levam cinco, dez anos para ficarem prontos! Então que fique aqui esclarecido que qualquer teste vocacional que não seja aplicado por um psicólogo não tem validade nem cientificidade. 


No mais, espero que esse artigo tenha ajudado. Quaisquer dúvidas, sugestões ou críticas, deixem nos comentários ou me mandem e-mail!


Referências:

LAVENFUS, Rosane Schotgues; BANDEIRA, Denise R. Avaliação dos interesses profissionais-AIP. São Paulo, Vetor. 2009.





quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

PSICOLOGIA E CARNAVAL



Ao ler o título desse artigo você deve estar se questionando o que tem a ver carnaval com Psicologia. Na verdade, o meu intuito é analisar um pouco como a Psicologia explica o carnaval, o comportamento humano nessa data tão específica.

O carnaval é uma festa antiga que começou no tempo dos escravos. Os escravos saíam pelas ruas com seus rostos pintados, jogavam farinha e bolinhas de água de cheiro nas pessoas. Era uma manifestação bastante popular, mas comemorado apenas pelos escravos e pelas famílias mais simples. Em meados do século XIX, no Rio de Janeiro, essa prática passou a ser criminalizada e a elite do Império brasileiro criava os bailes de carnaval em clubes e teatros. Contudo as camadas populares não desistiram de suas práticas carnavalescas. Desde então o carnaval foi se moldando até chegar no formato atual. 

No ano de 1641 foi realizado o primeiro baile de máscaras:

"O governador Salvador Correia de Sá e Benvides dedicou o primeiro Carnaval do Rio, em 1641, ao rei Dom João IV, o homem por trás das restaurações das leis de Portugal no Brasil. Uma grande atenção foi dada às celebrações, embora historiadores descartem o uso de máscaras durante o evento. Este foi seguido por outro espetáculo em 1786. No entanto, os historiadores acreditam que a primeira festa de máscaras foi realizada em 1840, no Hotel Itália, no dia 22 de janeiro como parte das celebrações de Carnaval. Contudo, ele só ganhou popularidade três décadas depois, quando uma grande importância foi dada às fantasias. Esses eram eventos luxuosos que segregavam poucos convidados da elite, enquanto outros bailes de máscaras eram realizados para todos. Com o tempo, esses eventos se tornaram mais populares durante o Carnaval do Rio e logo viraram a atração principal das celebrações com o espírito de competição aumentando."


Sabendo um pouco dessas referências históricas podemos refletir um pouco. A máscara é uma forma de esconder o rosto, de não se mostrar, de ocultar a identidade, assim como também é uma forma de se evidenciar. O próprio termo persona é derivado da palavra latina equivalente a máscara, e se refere às máscaras usadas pelos atores no teatro grego clássico para dar significado aos papéis que estavam representando.  O psicólogo Jung fala que a persona é "um complexo funcional que surgiu por razões de adaptação ou de necessária comodidade, mas que não é idêntico a individualidade. O complexo funcional da Persona diz respeito exclusivamente à relação com os objetos"(JUNG, 1991, p. 390). 

"Existem dois tipos de persona: uma para quando estamos sozinhos e uma para o convívio social. Esta última pode apresentar características positivas ou negativas, variando de indivíduo para indivíduo. Ela pode tanto proteger o ego, reprimindo sentimentos que podem ocasionar tragédias pessoais e desavenças no âmbito social, quanto criar uma identidade mascarada, artificial, contrária aos traços do sujeito (MELLO et al., 2002)"

Oliveira e Rocha (2012), colocam que:

"Pode-se dizer que a sociedade adentra-se cada vez mais no estágio estético (...) o qual se caracteriza pelo romantismo e o prazer propiciado pelo agora, ambos marcados pelo desejo, contrapostos à dor e ao tédio". 

As pessoas estão cada vez mais imersas na busca pelo prazer, nesse sentimento de realização de desejos, nessa fuga do cotidiano, do que é comum a todos. Fica fácil observar isso em nossa sociedade: falta de responsabilidades, relações superficiais, medo de enfrentar desafios e incapacidade de lidar com consequências negativas. Exemplos? Pessoas que não aceitam fim do relacionamento, jovens que engravidam e tentam o aborto. 

No carnaval não há desprazer. O carnaval é como um passaporte para a libertação total durante aqueles dias. Se você faz algo estranho, diferente, socialmente reprovável, é perdoado, porque no carnaval pode. A inversão de gênero, liberdade sexual excessiva e extravasamento através da bebida alcoólica, As máscaras ainda existem, mas não são mais tão necessárias. A necessidades das pessoas transgredirem a norma, o comum, o cotidiano é muito intensa.

Desta forma, surge no carnaval uma outra instância psicológica do sujeito: a Sombra, do qual falava Jung ou o Inconsciente, do qual falava Freud. A Sombra inclui aquelas tendências, desejos, memórias e experiências que são rejeitadas/reprimidas pelo sujeito como incompatíveis com a Persona (seu jeito de ser consigo e/ou com a sociedade) e contrárias aos padrões e ideais sociais. Quanto mais forte for nossa Persona, e quanto mais nos identificarmos com ela, mais repudiaremos outras partes de nós mesmos. A Sombra representa aquilo que consideramos inferior em nossa personalidade e também aquilo que negligenciamos e nunca desenvolvemos em nós mesmos. Já Freud falava sobre as pessoas experimentam repetidamente pensamentos e sentimentos que são tão dolorosos que não podem suportá-los. Tais pensamentos e sentimentos (assim como as recordações associadas a eles) não podem ser expulsos da mente, mas, em troca, são expulsos do consciente para formar parte do inconsciente.

Assim, durante os festejos carnavalescos podemos dizer que a Sombra/Inconsciente dessas pessoas aflora, principalmente após o uso de bebida alcoólica. Isso porque o álcool torna o sujeito mais suscetível a essas influências, diminuindo o autocontrole e o medo da reprovações sociais e morais. Isso somado a desejos reprimidos levam as pessoas a realizarem "loucuras" durante o carnaval. 

Aliás, você ouve o tempo todo a mídia se referir as pessoas que participam do carnaval como "foliões", e saiba você que a palavra folião vem do termo francês "folie" que significa loucura. Então o carnaval pode ser entendido como a celebração dos loucos, porque as pessoas se vestem de personagens ou com roupas do sexo oposto e fazem coisas sem sentido, se divertindo com isso. Entenda que a loucura, apenas uma observação de que a sociedade que excluiu o louco (para ver mais, leia sobre uma breve história da loucura aqui)

O carnaval é o momento que o sujeito pode ser quem ele quiser através da sua fantasia, pode flertar com várias pessoas sabendo que em algum momento alguém vai aceitar esse flerte, além de muita dança e diversão. O momento é ansiado por muitos justamente por permitir essa liberdade, por permitir viver os desejos

do inconsciente e por saber que suas atitudes serão "perdoadas" por ser carnaval, o período da folia (loucura, doidice). Beijar aquela pessoa que você não tinha coragem, fazer sexo com desconhecidos, vestir-se de forma esdruxula, usar drogas. O pior do carnaval são as atitudes autodestrutivas das pessoas. É como se a vontade de se divertir e aproveitar a festa fossem muito maiores que a prudência.

Então, da próxima vez que você for ao se divertir nessa festa tradicional lembre-se de ter aproveitar com responsabilidade, porque até mesmo o louco é responsável por sua loucura. Divirta-se com cuidado, evite doenças, acidentes, porque as pessoas ficam muito vulneráveis a todo tipo de sinistro nessa época. 




Referências:

http://brasilescola.uol.com.br/carnaval/historia-do-carnaval-no-brasil.htm

https://psicologado.com/abordagens/psicologia-analitica/máscaras-do-ego-aspectos-subjetivos-das-representações-do-corpo

http://amigosdofreud.blogspot.com.br/2012/02/persona-e-sombra-na-psicologia.html#.VryxIa33PKg

http://psicologiaanalitica.com/2015/05/02/algumas-consideraes-sobre-o-lugar-da-persona/

http://www.psiqweb.med.br/site/?area=NO/LerNoticia&idNoticia=192

MELLO, A. C. et al. Persona, de Ingmar Bergman. Cinematógrafo, FAAP, São Paulo, 2002.

http://www.papodepsicologo.com/2010/01/mascaras-para-vivermos-em-sociedade.html